quinta-feira, 5 de abril de 2012

 tormenta
Daniel encarava a baía. Seus olhos estavam tão cinzentos quanto a
espessa neblina que envolvia o litoral de Sausalito e as águas agitadas que
revolviam os seixos sob seus pés. Não havia nenhum vestígio de violeta
em seus olhos agora; ele podia sentir.
Ela estava longe demais.
Apertou os braços contra o corpo para se proteger do vendaval
que batia nas águas, respingando nele. Mas, mesmo quando fechou mais
ainda seu grosso casaco de lã, sabia que não adiantaria. Caçar sempre o
deixava gelado.
Apenas uma coisa poderia esquentá-lo hoje, e ela estava fora de
seu alcance. Sentia saudades de como o topo da cabeça de Luce era o
lugar perfeito para os lábios dele descansarem. Imaginava-se
preenchendo o vazio entre seus braços com o corpo dela,se inclinando
para beijar seu pescoço. Mas era melhor que Luce não estivesse ali agora.
O que veria a deixaria horrorizada.
Atrás dele, o ruído dos leões-marinhos indo de um lado para o
outro ao longo da costa sul da Ilha Angel soava como seus sentimentos:
uma solidão dolorosa, sem ninguém por perto para ouvi-lo.
Ninguém além de Cam.
Ele estava agachado na frente de Daniel, amarrando uma âncora
enferrujada em volta da forma molhada e desajeitada aos pés dos dois.
Mesmo ocupado com algo tão sinistro, Cam era belo. Seus olhos verdes
cintilavam e o cabelo escuro fora cortado. Era a trégua; ela sempre trazia
um brilho mais intenso aos anjos, uma luminosidade ainda mais forte no
rosto e no cabelo e até mesmo uma forma mais bem-feita ao já impecável e
musculoso corpo. Dias de trégua faziam pelos anjos o que férias na praia
faziam pelos humanos.
Então, mesmo que Daniel chorasse por dentro cada vez que era
forçado a acabar com uma vida humana, para qualquer um ele pareceria
um cara voltando das férias no Havaí: relaxado, descansado, bronzeado.
Apertando um de seus elaborados nós, Cam disse:
— É tão típico de você, Daniel. Sumir e me deixar fazer o trabalho
sujo sozinho.
— Do que está falando? Fui eu quem o matou. — Daniel baixou os
olhos para o homem morto, o cabelo grisalho e crespo grudado na testa 

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